Do enoturismo ao 'colha e pague': produtores de frutas diversificam e atraem público no interior de SP

Pequenas propriedades rurais que fazem parte do Circuito das Frutas, no estado de São Paulo, estão apostando na diversificação de cultivos e atividades como alternativa rentável e estratégica para os negócios familiares. Entre as oportunidades encontradas está a adoção do sistema “colha e pague”, atividade que une turismo rural e gastronômico. Leia também: Jovem vê oportunidade na fartura de frutas em sua cidade e apoia produtores locais Feira promove o turismo rural no Espírito Santo com produtos do agro “É uma estratégia que deu certo em muitos países, pois além de ampliar a renda, fortalece a marca local, estimula o consumo direto e cria novas oportunidades de negócios, ao valorizar o território e a identidade do produtor”, diz Pedro Izquierdo, engenheiro agrônomo, consultor e especialista em vitivinicultura, que esteve recentemente em Louveira para conversar com produtores do Circuito das Frutas sobre o assunto. Seguindo essa tendência de transformar a propriedade rural em um ambiente de experiência única, o casal Graziela e Rafael Michelin, de Jundiaí, se destaca. A família é tradicional produtora de uva na região, com atividades que remontam à década de 1930. Graziela e Rafael Michelin, de Jundiaí, implantaram o sistema “colha e pague” na propriedade Divulgação Nos últimos anos, no entanto, Graziela e Rafael sentiram a necessidade de uma atualização na rota dos negócios. Sentindo que a pressão imobiliária na região e a escassez de mão de obra começaram a impactar demais os ganhos com o cultivo de uva, eles buscaram alternativas. O primeiro passo foi diversificar. Eles reduziram as áreas dos parreirais e apostaram em outros cultivos como goiaba, pêssego, abacate e lichia, a fim de ter produção de frutas o ano inteiro. Mais tarde surgiu a ideia de implantar o sistema “colha e pague”, colocada em prática após a pandemia. “Aos poucos fomos estruturando a propriedade para receber os visitantes, algo que nos assustou no começo, mas fomos ajustando, adicionando novas culturas e tudo foi dando certo”, diz Rafael Michelin. A propriedade recebe centenas de visitantes aos finais de semana. “Para além da colheita das frutas, acrescentamos o café da manhã caipira, instalamos um trenzinho para deslocamento dentro da propriedade e temos parcerias com escolas da região. Também recebemos passageiros do trem expresso turístico de Jundiaí”, destacou Graziela. Renda impulsiona estratégia Ariana Sgarioni, enóloga e sócia da consultoria Enoconexão, conta que o movimento dos vitivinicultores do Circuito das Frutas, no interior de São Paulo, em busca de diversificação de cultivos ou investimento no turismo rural, tem crescido nos últimos anos, impulsionado pela busca de rentabilidade. “De oito anos pra cá, sentimos um aumento expressivo no número de produtores que nos procuram em busca de conhecimento e capacitação para ampliar seus ramos de atuação”, afirma. Ela explica que os produtores buscam alternativas para complementar o negócio, sem deixar de lado os cultivos atuais. Muitos buscam novas variedades de uva, para complementar a produção que até então era para consumo na mesa e passar a produzir vinhos artesanais, por exemplo. Outros reinventam as propriedades para receber turistas. “Há demanda do público por esse modelo de turismo e consumo de produtos artesanais, então a região vai se reinventando, sem deixar de lado as tradições que a fizeram prosperar até hoje. É bastante simbólico”, completa. Produtores buscam alternativas para complementar o negócio, sem deixar de lado os cultivos Arquivo pessoal Tradição chega à quarta geração A própria Ariana trabalha também com a vinícola da família, a Beraldo di Cali, em Jundiaí. A gestão da propriedade já está na quarta geração da família e passou por atualização de atividades recentemente. O sítio que era exclusivamente voltado ao plantio de uvas Niágara, hoje recebe uvas como Barbera, Alvarinho, Marselan e Sauvignon Blanc, destinadas à produção de vinho artesanal. Atendendo a pedido dos clientes, o local ganhou um restaurante e ampliou a capacidade de visitantes. Pensando a longo prazo, Ariana busca junto ao Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária) a aprovação para cultivo (ainda em fase de testes) da uva Cesanese, uma novidade no Brasil. “Serão dois anos de testes, para posterior licença junto aos órgãos nacionais. Estamos otimistas, buscando a produção de um vinho diferenciado”, declara. Mais de 400 pessoas a cada final de semana Diversificar também foi a aposta do produtor Ricardo Paulino, do Sítio Fragole, que desde 1977 produzia apenas morango em Jundiaí. Ele conta que, nos últimos anos, as margens de preço apertadas e a falta de mão de obra o levaram a pensar em vender a propriedade. Foi quando uma de suas filhas, formada em turismo, decidiu sair do emprego em que atuava para dar novos rumos à carreira e à propriedade da família. “Em 2010 já tínhamos feito um curso de turismo rural, porém fomos postergando a ideia até um momento que vimos que teríamos que fazer algo. Buscamos a secretaria de turismo em 2023, e implantamos de fato as mudanças para logo abrirmos as portas para os visitantes”, destacou Paulino. Precisaríamos de uma estratégia para deixar o visitante mais tempo na propriedade", diz Ricardo Paulino. Desde então, eles suspenderam a venda da produção de morango no mercado e passaram a comercializá-la apenas dentro da própria fazenda, no sistema “colha e pague”. Os proprietários também inseriram o plantio de amora e framboesa para proporcionar novas experiências aos visitantes e a colheita o ano todo. “Eu já tinha entendimento que somente a venda de produtos não seria suficiente, precisaríamos de uma estratégia para deixar o visitante mais tempo na propriedade, e implantamos, este ano, o café da manhã para melhorar essa experiência. Recebemos de 400 a 500 pessoas por fim de semana”, detalhou o produtor.

