Do tomate ao ketchup, a aposta da Kraft Heinz para avançar no Brasil

Do tomate ao ketchup, a aposta da Kraft Heinz para avançar no Brasil

Sob o sol forte de uma tarde de setembro, o verde e o vermelho que cobrem o campo fazem contraste com o céu azul do Planalto Central. É dessa plantação, na cidade goiana de Cristalina, que sai parte dos tomates usados pela multinacional Kraft Heinz Brasil para fabricar seu tradicional ketchup. Desde o ano passado, todo o molho produzido e comercializado pela empresa no Brasil utiliza apenas tomates nacionais. Leia também Tomate preto: conheça essa variedade exótica Preços do tomate caíram quase 20% no atacado em agosto “Alguns anos atrás, a gente não conseguia ter capacidade de produção do nosso volume e tinha que importar pasta de tomate da Califórnia para produzir o ketchup. A ótima notícia é que nossas safras têm melhorado em quantidade e qualidade”, afirma Ariel Grunkraut, CEO da Kraft Heinz Brasil em meio à plantação de tomates que, horas mais tarde seriam colhidos e transformados em pasta na indústria. Com a autossuficiência na produção da pasta de tomate no Brasil, a companhia já estuda até exportar a matéria-prima do ketchup. Atualmente, operações da Kraft Heinz na América Latina, em países como Costa Rica, Venezuela e México, seguem importando a pasta de tomate da Califórnia. Segundo o executivo, o crescimento da demanda no Brasil ainda impede o início das exportações no curto prazo. “A gente tem uma ambição de três a cinco anos de conseguir exportar para América Latina [...] e conseguir usar o Mercosul e abastecer os mercados latinos e hispânicos”. Hoje, apenas quatro países concentram todas as etapas da produção do ketchup Heinz: Brasil, Egito, Turquia e Polônia. Isso inclui desde o cultivo do tomate até a fabricação do produto. Ariel Grunkraut: "“A gente tem uma ambição de três a cinco anos de conseguir exportar para América Latina" Evandro Bueno Ferreira Para a empresa, investir na produção local traz benefícios logísticos e reduz a exposição a riscos externos. “Nossa velocidade de reação também é importante, porque uma vez que dependemos de um frete marítimo, de algo que vem da Califórnia, qualquer crise global no mundo de transporte e logística pode impactar diretamente, podemos eventualmente ter alguma falta de pasta Heinz para a produção. Então é importante ter a produção local também”, afirma Matheus Pimentel, diretor de Suprimentos e Agricultura da empresa. A produção local da pasta também permite à companhia reduzir impactos de variações cambiais e tarifárias, fatores que podem influenciar o custo da importação. O campo em Cristalina, com lavouras de tomate industrial a perder de vista, é apenas um dos locais que fornecem a fruta para a Heinz. No total são 13 produtores, localizados no Estado de Goiás, onde também estão as unidades fabris da empresa, em Nerópolis. Os agricultores produzem os tomates para a empresa mediante contratos de fornecimento. Todo o ano são impressionantes 7 bilhões de tomates colhidos, em lavouras que alcançam produtividade de 130 toneladas por hectare, de acordo com Heinz. Safra Na Fazenda Cupim, visitada pela reportagem, a safra, que se iniciou em julho, se aproxima das últimas semanas. Cerca de 350 hectares são destinados ao tomate industrial que será fornecido à Heinz. “Com o tomate de mesa, você fica muito à mercê do mercado. Você tem períodos do ano que o preço sobe muito, mas períodos do ano que cai muito. Com o contrato do industrial, às vezes não é uma rentabilidade tão grande quanto o tomate de mercado, mas é uma rentabilidade mais estável”, diz o gerente da fazenda, Cristiano Denes. Segundo Lucas Paschoal, diretor de Agricultura da companhia, a escolha de fornecedores é feita integralmente com base no Programa de Excelência, criado no ano passado. O programa avalia os produtores com base em qualidade, práticas sustentáveis, resultados e desempenho comercial. A pontuação define se o produtor continua no ciclo seguinte, se terá a área expandida ou se será substituído. Saiba-mais taboola Os produtores com melhor avaliação são classificados internamente como Top Growers. Eles recebem incentivos comerciais, acesso prioritário a novas tecnologias e podem participar do planejamento de safra da empresa. Em julho deste ano, todas as fazendas fornecedoras da Heinz no Brasil receberam a certificação internacional Farm Sustainability Assessment (FSA). Essa foi a primeira operação da empresa no mundo a obter a certificação. A Kraft Heinz entrou no Brasil, em 2013, com a compra da indústria de alimentos Quero, o que lhe permitiu não somente ter acesso à cadeia de processamento de tomate, mas também o contato com o segmento e com produtores rurais, observa o CEO Ariel Grunkraut. Nos últimos cinco anos, a Kraft Heinz fez, ainda, a aquisição das marcas Hemmer e BR Spices, e realizou um investimento de R$ 1 bilhão no período para a construção e modernização das unidades fabris em Nerópolis, Blumenau (SC) e Jandira (SP). Segundo Grunkraut, novas aquisições estão fora do radar da companhia. “Nós acabamos de completar as últimas duas aquisições em menos de cinco anos e estamos ainda integrando essas duas empresas no nosso portfólio. Então, o nosso desafio nos próximos 10 anos, é de fazer esse crescimento de maneira orgânica com as marcas que a gente tem”, afirma. Segundo o CEO, os produtos do portfólio da empresa ainda não alcançam todo o país como poderiam. Ainda assim, para este ano, a expectativa é de um crescimento acima de dois dígitos para o grupo no Brasil. O país é um dos cinco considerados estratégicos para a Kraft Heinz, sobretudo pelo potencial de crescimento. Também participa ativamente das decisões globais da empresa, já que boa parte da liderança sênior da companhia é composta por brasileiros. Nas últimas semanas, a Kraft Heinz global anunciou sua separação em duas empresas: a Taste Elevation, com molhos e condimentos, e a Groceries North America, com marcas de café, queijo, e outros. Grunkraut diz que a cisão deve ter pouco efeito sobre as operações brasileiras, uma vez que toda a subsidiária brasileira ficaria integralmente sob o controle de apenas a Taste Elevation. A Kraft Heinz, atualmente, tem como principais acionistas a Berkshire Hathaway, com cerca de 27% do controle, a Vanguard Fiduciary com aproximadamente 8,5% e a BlackRock com 6%. A 3G, que foi parceira da Berkshire durante a fusão da Kraft Heinz em 2015, zerou suas ações na companhia em 2024. *A repórter viajou a convite da Kraft Heinz