Favorecida pelo frio, Serra Gaúcha deve colher uvas mais doces e em maior volume

O clima ajudou, e os produtores de uvas da Serra Gaúcha, principal região vitivinicultora do Brasil, esperam uma safra volumosa e de boa qualidade da fruta neste verão. A colheita de algumas poucas variedades precoces, para consumo in natura, já começou, mas a maior expectativa é para a vindima das uvas viníferas, que deve se iniciar na metade de janeiro. Leia também: Três vinhos de fora do RS são destaque na 33ªAvaliação Nacional de Vinhos; conheça bebidas selecionadas Em Minas Gerais, vinho avança no ‘terroir’ do café Segundo o Instituto de Gestão, Planejamento e Desenvolvimento da Vitivinicultura do Estado do Rio Grande do Sul (Consevitis-RS), espera-se que colheita da uva da safra 2025/26 atinja 800 milhões de quilos, um aumento em torno de 50 milhões de quilos na colheita em relação à estimativa da temporada 2024/25 (750 milhões de quilos). O motivo para esse aumento foi a ocorrência de um inverno rigoroso, com mais 390 horas de frio abaixo ou igual a 7,2ºC, condição que beneficia o potencial de brotação da videira. No entanto, a Emater-RS, empresa pública de extensão rural e assistência técnica do Rio Grande do Sul, é mais cautelosa em relação às previsões para a colheita. “Tivemos um período recente de déficit hídrico, provocado pelo fenômeno La Niña, justamente no momento de enchimento das bagas da uva. Alguns parreirais devem sofrer murchamento, levando a uma redução no volume de colheita”, afirma Thompson Didoné, enólogo e extensionista rural da Emater-RS. Se o volume final de colheita é uma incógnita, a expectativa ainda é de alta qualidade das frutas, que devem gerar uma excelente safra de vinhos em 2026. “Não temos problemas de ataque de doenças, pragas, que cheguem a comprometer a safra. E um déficit hídrico quando o cacho está maduro ajuda a uva ficar mais doce e vinífera”, destaca Didoné. Segundo a Emater-RS, dos 45 mil hectares plantados com videiras no Rio Grande do Sul, 42 mil são ocupados por uvas destinadas à indústria e 3 mil para consumo in natura. “Da quantidade industrializada, 80% vai para fabricação de sucos e vinhos de mesa, e o restante para vinhos finos e espumantes”, explica o enólogo. A esperança de uma uva com maior grau de açúcar anima a indústria vinícola, pois isso garante uma bebida de melhor qualidade. “A safra 2025 já foi boa nesse sentido, e tudo indica que teremos mais uma safra de vinhos excelente", destaca Luciano Rebellato, presidente do Consevitis. O dirigente acredita que o setor irá se organizar para elaborar maior quantidade de vinhos, especialmente os mais leves, brancos e jovens, os quais se mostram como uma tendência para os novos consumidores. A maior expectativa é para a vindima das uvas viníferas, que deve se iniciar na metade de janeiro Felipe Dalla Valle-Palácio Piratini Expectativa otimista Na vinícola Casa Zottis, em Bento Gonçalves, as expectativas para esta safra são otimistas. “A qualidade e a sanidade da uva está excelente até o momento. Tudo está se desenhando para termos um vinho que os compradores vão querer guardar para momentos especiais”, afirma Juliano Zottis, vititucultor e proprietário da vinícola. Com 2,5 hectares de parreirais próprios e mais quatro arrendados, Zottis colheu cerca de 80 toneladas de uvas na última safra. Em 2026, ele espera produzir até 15% a mais. Do volume colhido, a sua vinícola utiliza apenas 30%, fabricando em torno de 15 mil litros de vinho por ano. Os 70% restantes são vendidos para outras indústrias. Entre as variedades produzidas pela Casa Zottis estão Cabernet, Merlot, Alicante Bouschet, Sangiovese, Pinot Noir, Chardonnay e Moscato de Hamburgo. Na agroindústria Videiras Carraro, também em Bento Gonçalves, foram colhidas 85 toneladas de uva em 2025. Para a nova safra, a expectativa é que sejam produzidas 100 toneladas, afirma o produtor Jean Carraro. Entre as variedades plantadas, estão Merlot, Malbec, Chardonnay, Pinot e Cabernet Franc. “Além disso, a uva está muito mais bonita, e se o tempo continuar ajudando, com certeza ela vai ficar mais doce”, afirma. “Também foi um ano que tivemos menos doenças nas parreiras, por causa do frio mais rigoroso no inverno. Foi mais fácil trabalhar”, comenta Carraro. O produtor espera começar a colheita na segunda quinzena de janeiro. Já a produção de vinho deve ser mantida na mesmo volume de 2025, em torno de 12 mil litros. Preço gera apreensão Um fator que preocupa os produtores é o preço esperado pela uva. Em dezembro, o Conselho Monetário Nacional (CMN), seguindo uma proposta da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), fixou, a partir de 1º de janeiro de 2026, o preço mínimo da uva industrial em R$ 1,80 o quilo, um reajuste de 6,5% sobre o valor praticado em 2025. Segundo Cedenir Postal, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bento Gonçalves, o preço estabelecido pela Conab fica próximo dos R$ 1,82 por quilo necessários para cobrir os custos de produção. O valor foi calculado pela Comissão Interestadual da Uva (CIU), que reúne produtores do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Produtor Jean Carraro espera aumentar produção neste ano Divulgação “O ideal seria que fosse além disso, mas diante das circunstâncias, ficou de bom tamanho esse acordo. Agora, o que a gente espera é que todas as empresas cumpram pelo menos o preço mínimo”, afirma Postal. O produtor Jean Carraro espera que, para suas uvas, sejam oferecidos, pelo menos, os mesmos valores de 2025, que ficaram entre R$ 2,20 e R$ 2,30 o quilo para as variedades comuns e de R$ 6 para as viníferas. “Dessa forma, cobriria o custo de produção”, afirma. Juliano Zottis está mais cauteloso. “No momento que se inicia a colheita, também começa a lei da oferta e procura. Se ficar em R$ 1,80 o preço mínimo, é um valor bom, mas os custos vem aumentando, especialmente com defensivos, combustível e manutenção de máquinas”, destaca o produtor.

